Origens
O Convento de Jesus da Ordem Dominicana feminina, um dos mais antigos de Aveiro, remonta à segunda metade do século XV, tendo sido fundado por duas senhoras viúvas, procedentes da nobreza portuguesa, D. Brites Leitão (vinda da corte do Infante D. Pedro, Duque de Coimbra) e por D. Mécia Pereira (Condes da Feira). Em 1461, o Papa Pio II concede-lhes a bula que autoriza a sua constituição, e no ano seguinte é lançada a primeira pedra da igreja, com a invocação e nome de Igreja de Jesus, pelo Rei D. Afonso V, iniciando se então a vida de clausura da Ordem Dominicana feminina em Aveiro, num convento que irá crescer em espaço, e em número de religiosas.
Entre estas encontrar-se-á um pouco mais tarde, a Infanta D. Joana, filha de Afonso V, que entra no Convento de Jesus, em 1472, onde vive até à sua morte, em 1490, levando uma vida de santidade (‘cuja memória se perde no tempo’ como reza a sua Crónica), o que, gorado que foi um 1º processo de beatificação, a conduz num 2º momento à sua beatificação em 1693, processo este suportado pela Coroa e pela Ordem Dominicana em Portugal, em particular. Dentão em diante, não apenas o prestígio do Convento fica definitivamente associado à figura da Princesa Santa Joana, como, no sentido inverso, a história e vida da Princesa Santa Joana e a sua presença no seu culto religioso, faz parte da história deste antigo Convento, e da do posterior Museu.
Entre os sécs. XVI e XVIII, o edifício conventual foi sendo construído em conformidade com as directrizes arquitectónicas da Regra da Ordem e sofreu diversas campanhas de obras de ampliação, de melhoramentos e de enriquecimento artístico. Nestes destaca-se em particular, o dos revestimentos interiores em talha dourada, em espaços como a Igreja, o Coro-baixo, o Coro-alto, nas múltiplas capelas devocionais deste Convento, que chegaram até aos nossos dias (de tal modo relevante, que, no séc. XX o Museu de Aveiro foi merecendo o epíteto de “Museu Nacional da Talha”, denominação que nunca chegou ser oficializada). Para este enriquecimento, seguramente contribuiu a exteriorização da devoção e culto resultante da Beatificação da Princesa Santa Joana, entre outros factores, como a situação geográfica da vila, depois cidade de Aveiro, marítima e fluvial, que facilitou as encomendas aos entalhadores do Norte, o desenvolvimento da Arte Barroca, a riqueza do Convento, também originária de dotes das religiosas e de outras ofertas, e, já no séc. XVIII, o século de ouro português, beneficiando da vinda do ouro do Brasil. Neste engrandecimento do Convento de Jesus de Aveiro, salienta-se que, paralelamente a sua comunidade também cresceu ao longo dos tempos, chegando a ter oitenta religiosas.
Em tempos de perseguição religiosa
Contudo, como é conhecido, no contexto sócio-político do Liberalismo do séc. XIX, o avanço do ideário liberal tem profundas repercussões na vida religiosa de clausura, e/ ou monástica, das ordens militares, e da vida religiosa consagrada em geral em Portugal. Logo na 1ª metade do século, por decreto de 1834, o ministro Joaquim António de Aguiar determina a extinção das ordens religiosas no reino, sendo a sua aplicação imediata nos conventos masculinos, a proibição de novas entradas nos conventos femininos, permitindo, porém, a vida de clausura nos conventos femininos até à data da morte da última freira.
Sendo assim, o Convento de Jesus, de Aveiro, mantém a sua norma de vida de clausura até 1874, data da morte da sua última religiosa.
Em 1882, o edifício é entregue à Ordem Terceira Dominicana, que o transforma em Colégio de Santa Joana.
Com a implantação da República, em 1910, e o agravo da intolerância religiosa em todo o país, a comunidade do Colégio de Santa Joana, em Aveiro é dissolvida. Neste mesmo ano, o mosteiro é fechado e lacrado, e a sua área monumental, constituída pela Igreja de Jesus e pelo Túmulo da Princesa Santa Joana (Coro-baixo), é classificada como monumento nacional.
Muitos são os factores de ordem museológica, histórica, política, de devoção religiosa, de salvaguarda do património que contribuíram, como os seus respectivos defensores, para o destino seguinte deste Convento. O que é facto é que o Museu de Aveiro é instalado no Convento de Jesus – com todo o valor que este património simbolizava e representava – em 1911, e é criado legalmente em 1912.
Com a implantação da República, em 1910, e o agravo da intolerância religiosa em todo o país, a comunidade do Colégio de Santa Joana, em Aveiro é dissolvida. Neste mesmo ano, o mosteiro é fechado e lacrado, e a sua área monumental, constituída pela Igreja de Jesus e pelo Túmulo da Princesa Santa Joana (Coro-baixo), é classificada como monumento nacional.
As coleções do Museu
Quanto às coleções do Museu (refiram-se a pintura, a escultura, a ourivesaria, os têxteis, o mobiliário, a talha, a azulejo), a sua constituição é sensivelmente a mesma entre si. Com as obras provenientes dos antigos Convento de Jesus e Convento de São João Evangelista de Aveiro, constitui-se, em 1911, por decreto, como referido, o fundo de origem do Museu. Este núcleo original é logo acrescido pelas obras provenientes do extinto Convento da Madre de Deus de Sá de Aveiro, sendo estes os três conventos femininos, que sobreviveram até ao final do século XIX em Aveiro.
Ao núcleo original das colecções do Museu, associa-se ab initio também, o património relativo ao culto da Princesa Santa Joana, figura de importância já reconhecida na história do Convento de Jesus. O respectivo património móvel, foi entregue em 1877 à guarda da Real Irmandade de Santa Joana, mas permaneceu no Convento de Jesus até 1910, pelo que não se perdeu, e com a 1ª República, extinta a Real Irmandade, o acervo é transferido para o Estado. Em 1910, o Túmulo da Princesa, que se conserva in situ no Coro-baixo do antigo Convento de Jesus, e hoje se inclui na arquitectura tumular do Museu, é, como já dito, classificado como monumento de interesse nacional.
Com a aplicação da legislação republicana no âmbito patrimonial e museológico, além do religioso, são também incorporadas nas colecções do museu, obras provenientes dos conventos masculinos de Aveiro, extintos em 1834: Convento de Nossa Senhora da Misericórdia, actual Sé de Aveiro, Convento de Santo António e do Convento do Carmo, das Ordens Dominicana, Franciscana e Carmelita. São também então incorporadas, obras da Sé de Aveiro. Este património chega e entra no Museu de forma directa ou procedente já de outras entidades como a Câmara Municipal de Aveiro, Paróquias ou Juntas de Freguesia, Confrarias ou Irmandades, casas particulares e famílias, onde foi “albergado” até ao final do séc. XIX e à viragem do séc. XX.
Para conformar as suas colecções, no decorrer do primeiro quartel do século XX, o Museu de Aveiro é ainda enriquecido por acervos provenientes de outros conventos extintos no resto do país, nomeadamente de Coimbra e de Lisboa. Acresce referir que, no contexto da reforma administrativa da diocese de Aveiro do final do século XIX, várias igrejas sede de freguesia são então demolidas, donde, muitas das suas obras são desaparecidas, outras incorporadas nas colecções do Museu de Aveiro logo em 1911.
O “Museu de Aveiro/ Santa Joana”, poderá hoje ser considerado um exemplo vivo de preservação e fruição de património cultural, histórico, artístico e religioso, onde a espiritualidade vs. imaterialidade, nele presente, poderia ser o paradigma da evolução de uma sociedade religiosa para uma sociedade laica
Sendo esta primordialmente a proveniência das colecções deste Museu; compreende-se a predominância sacra que a caracteriza. Pelo que, além de doações particulares, depósitos e outras incorporações, as colecções do Museu foram enriquecidas até hoje, em consonância com essa predominância, a par do seu valor histórico-artístico. Sobre este seu valor, historicamente, refere-se que, além das exposições do século XIX realizadas em Aveiro (Exposição Distrital de Aveiro, de 1882 e Exposição Arte Religiosa no Colégio de Santa Joana, de 1895), o Museu têm estado representado por inúmeras obras das suas colecções, em exposições nacionais e de âmbito internacional desde o século XX.
O nascimento do Museu
A origem do centenário Museu de Aveiro, compreende-se assim, nos contextos sócio-político, cultural e museológico do séc. XIX ao 1º quartel do séc. XX, e ao longo da sua vida nele está salvaguardada a história do antigo Convento de Jesus, de Aveiro. A “feição religiosa” patente neste Museu, dos vestígios do espaço conventual às suas colecções, bem como a espiritualidade, no caso muito particular como é o da devoção e culto da Princesa Santa Joana, desde logo da cidade, do distrito e da diocese, que permanece até aos nossos dias, hoje designado “património imaterial”, são algumas das suas características particulares, sem deixar de ter a sua vocação de conservação e preservação do património e colecções, da produção do seu conhecimento e divulgação, nem a sua vocação pública cultural, educativa e de lazer.
Refira-se ainda que o Papa Paulo VI a 5 de Janeiro de 1965, constituiu oficialmente a Princesa Santa Joana, como comumente é designada, padroeira da cidade e da Diocese de Aveiro, e, por fim, refira-se que, sendo até à data de hoje Beata, está aberto e em curso neste tempo presente, o seu processo de canonização.
Por tudo quanto ficou dito, o ora “Museu de Aveiro/ Santa Joana”, poderá hoje ser considerado um exemplo vivo de preservação e fruição de património cultural, histórico, artístico e religioso, onde a espiritualidade vs. imaterialidade, nele presente, poderia ser o paradigma da evolução de uma sociedade religiosa para uma sociedade laica.
Contactos e informações
Morada: Av. Princesa Stª Joana – 3810-329 AVEIRO (link para a localização)
Na Internet: Página do facebook
Telefones: 234 423297 / 234 383188
Email: [email protected]
Horário: 3ª feira a Domingo – 10h00-12h30/ 13h30-18h00
Encerra: às 2ªs feiras e nos dias feriados de 1 de Janeiro, Domingo de Páscoa, 1 de Maio e 25 de Dezembro
Bilheteira: entradas pagas e gratuitas consoante idades e grupos sócio-profissionais.
Tutela: Ministério da Cultura
Entidade de gestão: Câmara Municipal de Aveiro
Este texto foi publicado no Caderno Cultural da revista Brotéria de Março
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.
Sugestão Cultural Brotéria
Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.
Conheça melhor a Brotéria